quinta-feira, 29 de novembro de 2018

ESBOÇO DE SANIDADE



 
Paulo Maccedo -28/11/2018 -Sabe aquela prima universitária que posta no Twitter que não quer participar do churrasco em família para não olhar para cara do tio "fascista"? Então, ela está tendo uma visão distorcida da vida.
  Para ela, o tio é fascista porque tomou uma decisão política diferente de seu ideal. Ela começa a olhar para ele como um inimigo, mesmo que esse tio tenha sido relevante — não digo maravilhoso, mas relevante — durante toda a vida.

Por conta de sua ideologia, ela acaba apagando da memória as vezes que o tio lhe trouxe presentes; que a levou para passear no parque junto com sua prima, filha dele; quando teve conversas inteligentes e preocupadas, afinal, é filha de sua irmã. Ela nem vai considerar que ele a presenteou com um buquê de flores no seu aniversário de 15 anos.

É esse o tipo de fanatismo que a paixão política traz. É parecido com a atitude da pessoa que se converte a uma religião e começa a ver toda a família como ímpia, que evita participar das reuniões familiares porque seus entes agora são pagãos diante dela, uma santidade.

É distorção. A psicologia explica que há um tipo de distorção chamada “maneira de pensar tudo-ou-nada”. É uma concepção, argumentação e julgamentos em termos absolutos, como “sempre”, “todos”, “nunca”, e “não há alternativa”.

E isso acontece, por vezes, ligado ao "raciocínio emocional", que é o vivenciamento da realidade como um reflexo de emoções, por exemplo, “Eu sinto, portanto, deve ser verdade”.

Para a prima revolucionária (aqui uso prima apenas como exemplo aleatório — poderia ser primo ou tio, ou pai), há um mal em não compactuar da mesma ideologia e ter uma visão de mundo diferente, mesmo que seu discurso seja baseado em tolerância e respeitar o diferente.

E se a família conversa sobre coisas banais mas interessantes, como a mudinha de planta colhida no sítio, o chá que cura dor de cabeça, a reforma do piso da cozinha, soa como alienação. Como assim eles não falam das manifestações do movimento dos sem-terra? Como podem ser tão alienados?

Ela fica lá no canto, com um sorriso amarelo, só pensando nos seus ideais políticos e sociais. Não consegue desligar e participar da conversa sobre cotidianos. É tudo muito chato, comum demais para quem luta por pautas tão dignas.

Ela não come churrasco porque pensa no boi que sofreu para dar carne aos metidos de classe média; não toma refrigerante porque causa câncer e engorda — e a última coisa que ela quer é parecer com a tia pançuda com dois filhos criados que só fala em tupperware.
Churchill tem uma frase que se encaixa perfeitamente no contexto: “Fanático é o sujeito que não muda de ideia e não pode mudar de assunto”. Não há nada mais triste do que não conseguir mudar de assunto. É escravidão tentar encaixar tudo num prisma ideológico, que por consequência, é limitado, para conduzir as conversas.
A prima revolucionária tem todo direito de lutar por seus ideais, mas é preciso alertar que ela pode estar pensando e agindo de forma não saudável. Seu fanatismo pode levá-la ao pensamento autoritário e, dependendo do caso, totalitário. Ela vai cada vez menos respeitar o diferente, por mais que se negue.
Há de se convir também que não conseguir falar sobre coisas pequenas é não desfrutar de um elevado privilégio. O que de mais especial nós temos é a simples grandiosidade da vida comum.
Falemos cada vez mais sobre mudinhas de planta colhidas no sítio. Ou, "Cacete, prima, larga de ser chata!".
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Autor: Paulo Maccedo.


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